Entrevista exclusiva a Paulo Rodrigues (Presidente da Direcção Nacional da ASPP/PSP)

Para Paulo Rodrigues (Presidente da Direcção Nacional da ASPP/PSP), o Estado desresponsabiliza-se da sua missão de garantir a segurança aos cidadãos. Por uma questão economicista, abre-se assim o caminho à segurança privada com os cidadãos a investir na sua própria segurança. Não concorda com os serviços remunerados mas sim com uma actualização digna da tabela salarial das forças de segurança pública. Em relação à ANASP, aquele responsável afirma que esta associação deveria fazer parte do Conselho de Segurança Privada.


- Breve historial da ASPP-PSP .

A Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP) é uma organização profissional, nascida logo após a Revolução de 25 de Abril de 1974 e representa há mais de 20 anos a maioria dos profissionais da PSP.

A ASPP/PSP tem mobilizado as suas energias desde 1982, para se bater pelos direitos mais elementares dos cerca de 20.000 profissionais da PSP, assim como para defender a imagem de uma instituição incumbida, pela Constituição democrática de Portugal, de garantir as liberdades individuais dos cidadãos.

Desde então, a luta pelo sindicalismo na PSP passou por várias etapas, tendo a mais mediática sido o 21 de Abril de 1989, mais conhecido como “Secos e Molhados”, quando o Governo da altura decidiu lançar polícias contra polícias, numa tentativa de travar um movimento que se adivinhava impossível de travar.

Seguiram-se anos de luta, relacionados com o facto de a então Associação Socioprofissional da PSP ver-lhe negados alguns direitos no diálogo com o Governo, o que potenciou a necessidade de haver o direito ao sindicalismo, que só veio a suceder com a publicação da Lei 14/2002.

Desde então, a ASPP/PSP mantém-se na vanguarda da luta pelos direitos dos profissionais da PSP e em defesa da segurança pública, quer seja através do diálogo com diversas entidades, quer seja através de formas de luta, como sucedeu ainda recentemente, a 21 de Maio de 2009, quando teve lugar a maior manifestação de profissionais da Polícia de sempre, com cerca de 8.000 presenças em Lisboa, onde se reivindicava um estatuto profissional digno para a PSP e seus profissionais.

Actualmente dos cerca de 20.000 profissionais da PSP, estão associados a esta organização mais de 11.000.
- Como encara o surgimento da ANASP no actual contexto nacional da segurança privada?

Uma organização como a ANASP, com uma postura coerente e responsável, representativa dos funcionários da segurança privada, é sempre importante, sobretudo para o equilíbrio necessário ao contexto laboral de quem actua nesse sector.

- De que forma podem coabitar segurança pública e segurança privada?

É impossível pensar numa sociedade como a actual, no que diz respeito à segurança pública, sem as empresas de segurança privada. Desde que as fronteiras, ao nível das competências, entre as forças de segurança e a segurança privada estejam bem definidas e sejam respeitadas, não existe incompatibilidade alguma, bem pelo contrário. O serviço de segurança privada pode ser um importante complemento ao serviço das polícias.

- A segurança pública está a ser ultrapassada pela segurança privada em termos de campo de actuação?

Não me parece. No entanto, as dificuldades económicas e financeiras do país podem reflectir-se negativamente, também nas forças de segurança, e tender a decisões governamentais ao nível da política de segurança interna, revestidas de estratégias economicistas, privilegiando o sector de segurança privada, obrigando o cidadão a investir na sua própria segurança. Daqui surge a desresponsabilização do Estado da obrigatoriedade de assegurar a segurança de todos os cidadãos, independentemente da situação económica e social de cada um.

- O sindicalismo em Portugal constitui um entrave ou um aliado ao bom desenvolvimento da actividade policial?

O sindicalismo, em meu entender, independentemente do sector de actividade, é por excelência um motor para a modernização equilibrada das instituições. A ASPP/PSP teve e tem um papel preponderante na PSP, essencialmente na abertura da Instituição à sociedade. Em 1989, a PSP ainda gozava da imagem construída ao longo do tempo pela conjuntura política antes do 25 de Abril, uma imagem de distanciamento entre a Polícia e o cidadão, uma imagem austera e unicamente repressiva que, com a legalização do associativismo, foi mudando. Hoje é visível a evolução positiva da imagem da PSP ao longo das últimas duas décadas.

- Como encara a ASPP-PSP o facto de a segurança privada usar arma de fogo?


Como qualquer cidadão, um profissional da segurança privada pode, segundo a Lei, requerer licença de uso e porte de arma se considerar que reúne os requisitos para esse fim, nomeadamente o nível da perigosidade a que está sujeito na execução do seu serviço, respeitando as regras no seu uso e transporte. Considero no entanto que existem serviços de segurança privada, pontuais, que só pela sua natureza e risco devem ser munidos de arma de fogo, especialmente nos serviços de transportes de valores ou serviços, que exijam condições especiais de segurança. O uso, não dissimulado, de arma de fogo, na generalidade dos serviços de segurança privada, não me parece um factor de segurança, nem para o serviço nem para o próprio profissional, bem pelo contrário, pode até transformar o profissional num alvo privilegiado.

- O Conselho de Segurança Privada necessita de se modernizar ou está no bom caminho?

O Conselho de Segurança Privada tem de ser agilizado e é importante que os profissionais da segurança privada lá estejam representados, como principais conhecedores dos problemas que afectam o sector. É necessário que haja um diálogo franco e aberto entre todas as partes, para que uma matéria sensível como a segurança avance no bom sentido.

- Existe uma preocupação latente por parte do Governo de dotar a segurança pública de meios humanos e materiais para o bom desempenho da actividade?

Nos últimos anos, a ASPP/PSP tem reivindicado o aumento de efectivo, nomeadamente depois da reorganização das áreas de competência entre a PSP e GNR. A falta de efectivos tem levado a instituição a exigir dos profissionais da PSP um esforço desmedido, que se reflecte na qualidade do serviço desempenhado. Mas a carência de efectivos tem levado também a Instituição a apostar nos serviços remunerados. Por um lado, com estes serviços a PSP consegue garantir mais polícias visíveis e no terreno, por outro lado, os profissionais, apesar de trabalharem 10 horas por dia em vários dias da semana, o que provoca um desgaste físico e psíquico acentuado com reflexos negativos na qualidade do serviço prestado, melhoram o seu vencimento, que por si só é reduzido.

Aproveito também para esclarecer algumas dúvidas em relação à posição da ASPP/PSP sobre se os profissionais devem ou não prestar serviços remunerados. Apesar deste nosso entendimento já ter mais de uma década e apesar de ser público, reafirmo mais uma vez que não concordamos com os serviços remunerados na PSP. Para além de estes serviços não prestigiarem a instituição e os seus profissionais, bem pelo contrário, também nada dignificam a prestação do serviço público. Temos reivindicado, por isso, uma melhoria na tabela salarial da PSP, para que os profissionais não sejam obrigados a prestar este tipo de serviços, que os desempenham unicamente por necessidade, devido à fraca remuneração.
- E em relação à segurança privada, há sensibilidade governamental para o fenómeno deste tipo de segurança cada vez mais abrangente?

O Governo já percebeu há muito tempo a importância da segurança privada em Portugal e quais os serviços que devem ser desempenhados pelas forças e serviços de segurança e pela segurança privada. Infelizmente, devido à falta de coragem e de políticas de segurança pouco correctas e de cariz económico, continua a deixar que se confunda serviço de cariz público do serviço de cariz privado.

- Como encara a ASPP-PSP a recente operação NEMESIS em Lisboa e Setúbal?

Esta operação, bem como outras com estes resultados, se bem que nos retraem pela sua mediatização e pelo facto de envolverem profissionais e técnicos de segurança pública, reforça a nossa intransigência no combate ao crime, actuando sempre com a mesma firmeza, independentemente de estarmos ou não perante indivíduos que exercem actividade em sectores da segurança.

- Os gangs de segurança privada estão a tomar de assalto o sector, estrangulando-o?

Não, mas é imprescindível uma atenção redobrada das forças e serviços de segurança sobre esta matéria. A criação do departamento para a fiscalização da segurança privada na dependência da Direcção Nacional da PSP, veio dar competência à PSP para fiscalizar e garantir um sector mais regrado. Este departamento tem desenvolvido um trabalho bastante importante, por vezes em coordenação com o departamento de investigação criminal da PSP, e os resultados desse trabalho são visíveis. Uma fiscalização rigorosa beneficia não só as forças de segurança como a segurança privada. Quantas vezes se confunde, por desconhecimento, a segurança privada ilegal da legal, descredibilizando o sector, bem como os seus funcionários.
- Que medidas proporia a vossa associação para um saudável desenvolvimento da segurança privada em Portugal?
Como referi, a segurança privada é hoje uma realidade em Portugal, tendo-se tornado imprescindível no panorama da segurança. Desde que sejam definidas as competências da segurança privada com objectividade e se instale uma coordenação institucional entre as forças de segurança e a segurança privada, estarão encontradas os pilares para um crescimento saudável deste sector. Outra matéria não menos importante para o crescimento sustentado e equilibrado deste sector é o cumprimento e respeito pelas leis e regras que estabelecem os direitos dos profissionais da segurança privada. Neste sentido, o MAI deve fiscalizar e obrigar as entidades competentes a fiscalizar o cumprimento das Leis que garantem o normal funcionamento das instituições e o equilíbrio entre os deveres e direitos dos profissionais da segurança privada.
- A formação constitui um factor chave para o bom desempenho da segurança privada?
A formação é um factor essencial para o bom desempenho de qualquer actividade. Nesta área, a formação torna-se ainda mais importante, não só ao nível da formação de base, essencial na preparação inicial, mas também a formação contínua, para actualização de conhecimentos técnicos e teóricos. A actividade de segurança privada deveria ser reconhecida como actividade profissional pelo ministério da Educação, como forma de serem disponibilizados cursos técnicos nas escolas de ensino profissional, com as devidas equivalências de ensino. Assim, garantir-se-ia uma melhor qualidade de serviço, privilegiando profissionais e empresas do sector.
- Concorda com a inclusão da ANASP no Conselho de Segurança Privada?

Parece-me essencial, não só pelo conhecimento e informação privilegiada devido à relação directa da ANASP com os profissionais, mas também pelo equilíbrio que criaria, essencial no seio desse Conselho.

Jorge Paraíso

(Assessor de Imprensa da ANASP)

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Sandro Bala: “Na Margem Sul mando eu” .

Programas para Desbloquear Telemóveis

Volume de Negócios / Empresas de Segurança Privada